O Brasil passou em 2016 por um dos períodos mais difíceis de sua história, enquanto os executivos tiveram que inovar para deter a destruição de valor nas empresas. Apresentamos para vocês as principais tendências em Supply Chain durante a crise bem como algumas perspectivas para 2017.
Após a grande oscilação política e econômica em 2016, finalmente iniciamos o ano de 2017 com melhores perspectivas. Neste contexto, as empresas continuam aproveitando o momento para reestruturar a configuração das suas cadeias de valor como forma de garantir a eficiência e sustentabilidade dos negócios no longo prazo.
A Sintec Consultoria, em parceria com a revista Mundo Logística, realizou um levantamento dos principais tipos de projetos executados por empresas de diversas indústrias nos últimos 15 meses e descreve alguns desafios no mercado Brasileiro para 2017.
As tendências, foram divididas de acordo com o elo na cadeia onde foram identificados os principais projetos: a) suprimentos e manufatura, c) rede de distribuição e d) logística e transporte. Entre os principais drivers que motivaram as mudanças identificadas estão: redução de custos, a simplificação dos processos, o aproveitamento de oportunidades e, em alguns casos, a proximidade geográfica ao cliente.
Suprimentos e manufatura: Ajuste da capacidade produtiva e redução de complexidade
As áreas de suprimentos e manufaturas foram demandas pela simplificação dos processos e redução de custos, com a dificuldade adicional de contar com menos recursos e pessoas. Para atender às exigências do mercado em crise, as frentes de ação mais comuns foram desenvolvidas na simplificação da matriz de matéria prima, a renegociação de contratos, a otimização da eficiência nas linhas de produção e, em casos mais radicais, a reconfiguração da malha produtiva e o portfólio de produtos.
Como exemplos dessas iniciativas podemos citar a Ambev que dedicou esforços para incrementar o uso de embalagens retornáveis como forma de oferecer preços exequíveis para o mercado; o que atinge uma necessidade do consumidor a partir de mudanças na manufatura.
Em uma situação distinta, a Duratex, líder no mercado de painéis de madeira, louças e metais, levou a cabo o fechamento temporário da sua unidade em Itapetininga no início do ano procurando com isso a redução de custos fixos na ordem de R$ 35 milhões ajustando suas capacidades às perspectivas de uma demanda restrita,
Já a Brasil Kirin atuou em frentes mais radicais, primeiro vendendo para Ambev a sua planta em Cachoeiras de Macacu e depois anunciando um processo de revisão da sua capacidade industrial. As mudanças da Brasil Kirin parecem ter um racional competitivo-estratégico para se focar nas categorias e regiões onde a equação Receita – Custos tem atratividade de longo prazo. O exemplo da Brasil Kirin envolve mudanças motivadas por desafios que vão além da situação do consumo Brasileiro e respondem a uma revisão do seu modelo de negócio no Brasil.
Em todos os casos, a procura de eficiência é o fator comum, mas dada à dimensão e complexidade de mexer na cadeia produtiva as organizações requerem encontrar o ponto de equilibro entre velocidade de reação e nível de planejamento já que isso determinará, em grande medida, o sucesso da estratégia.
Rede de distribuição (Malha Logística): Custo, simplicidade e oportunismo
No período da crise, outro tema que foi recorrentemente revisado pelas empresas foi a malha de distribuição. Diferentemente do que acontecia antes da crise, o principal driver das malhas deixou de ser a proximidade ao cliente (serviço) para dar prioridade à eficiência em custo. Por conta disso, muitas organizações tiveram como objetivo otimizar pontos específicos da malha procurando ganhos de curto prazo; o que já é um desafio se levarmos em conta o horizonte típico de payback de um projeto de malha que gira em torno de 2 a 4 anos.
Durante 2015 e 2016 foram feitos múltiplos projetos de malha através dos quais foram obtidos ganhos de curto prazo como: a) Redução do custo de aluguel de CDs resultante de uma redução do número de pontos de atendimento e de um aproveitamento das capacidades de armazenagem em unidades próprias b) Redução de custo de transporte e distribuição, através de pontos de atendimento sem estoque perto de regiões específicas no interior dos estados e c) Reconfiguração das malhas das grandes metrópoles para ter mais de 1 ponto de atendimento e reduzir a distância percorrida em zonas que a complexidade de trânsito continuará aumentando.
É importante ressaltar que qualquer desenho de malha nas metrópoles deve levar em conta as tendências de crescimento populacional bem como a redução na velocidade média que, no caso de São Paulo, foi de aproximadamente 9% entre 2008 e 2013, segundo a Companhia de Engenharia de Trafego.
Em menor medida, existiram empresas que revisaram a malha com um enfoque misto entre proximidade ao mercado e otimização de custo. Na BRF, a empresa está investindo para estruturar uma rede de distribuição avançada que permita reduzir o tempo de resposta ao mercado (Lead Time). Como resultado, um novo centro de distribuição está sendo implantado em Londrina (PR) o que se soma a outras mudanças como a Implementação de um CD em Salvador, a consolidação de vários armazéns em um único local no Rio de janeiro e o Incremento de pontos de transbordo de 30 para 57 procurando diminuir estoques e distância percorrida
O grande desafio nas malhas é encontrar o balanço entre custo e capilaridade para obter uma configuração que permita atender ao mercado dentro dos parâmetros da oferta definida. Para isso, se requer integrar nas análises elementos de mercado e consumidor e no só elementos de operação logística.
Logística: Dilemas make-or-buy e compartilhamento de frota
Outro tema de grande importância è a resolução dos dilemas Make-or-buy. Pressionadas pelo crescimento dos custos, várias empresas têm sido obrigadas a explorar a terceirização de processos. O principal problema identificado nos projetos realizados nesse ano pela Sintec é que muitas vezes a decisão de terceirizar é feita sem entender as alavancas de custo, serviço e gestão. O risco dessa abordagem é pensar que a eficiência de terceirizar está exclusivamente na negociação enquanto esse entendimento pode resultar em pressões sobre o fornecedor até o ponto em que ele se torna insustentável.
Um exemplo típico desse tipo de dilemas é a terceirização do transporte. No Brasil, devido a aversão à alavancagem operacional, a terceirização é um tema constante na agenda que deve considerar primeiro se a atividade é uma competência core e em seguida definir o perfil do serviço para entender o tipo de transportadora a ser considerada como parceira. Por último, tem que ser avaliadas aquelas alavancas de custo, eficiência e gestão que de acordo ao observado no mercado, estão atreladas a 4 principais fatores:
- Patamares de custo: Atrelados ao porte da organização em termos de faturamento, número de funcionários e exposição da marca da empresa.
- Complexidade de Gerenciamento: Na medida em que se fala do gerenciamento de centenas ou milhares de rotas de distribuição existe uma maior complexidade que pode ser um obstáculo para um adequado controle dos custos.
- Diferenciação entre terceirizar processos ou ativos: Quando se pensa em terceirizar processos (atividades, funcionários), as competências do fornecedor serão o mais relevante na avaliação. Se estamos pensando em terceirizar ativos (caminhões), a capacidade de investimento do embarcador e a aversão ao gerenciamento de frota estarão claramente estar no top da agenda. Nem todas as empresas tem isso claro ao tomar decisões relacionadas com a terceirização do transporte.
- Clareza de papeis entre fornecedor e embarcador: Uma das principais razões de fracasso das iniciativas de tercerirização é a falta de clareza sobre as atividades a serem realizadas pelo fornecedor. Ter atividades sem dono ou atividades duplicadas pode se traduzir em ineficiências não planejadas que vão ter um impacto seja no custo ou no serviço.
Além dos dilemas make-or-buy, atualmente existe uma tendência para incrementar esforços focados na logística colaborativa ou compartilhamento das capacidades. Uma solução que tem sido testada com certo sucesso é o compartilhamento de frota entre embarcadores. Nesse sentido, sobressai o esforço realizado pela Heineken a través do qual atualmente se compartilham ~15% das viagens de transporte primário com um pool de até 12 fornecedores da Indústria de Bens de Consumo de alto giro. O programa chamado de Collaborative Logistics Program tem como objetivo compartilhar até 20% das viagens em 2018, conforme apresentado por no 29º Simpósio CICLO Supply Chain & Logística pelo Ronaldo Pivisan, Gerente de Logística da Heineken no Brasil.
Na distribuição, existem outros esforços semelhantes. Um exemplo é o compartilhamento de estruturas de armazém e distribuição entre Souza Cruz e Diageo. A parceria com a Diageo representa um passo adicional na estratégia de compartilhamento da Souza Cruz que fechou acordos desse tipo com fornecedores como a Procter & Gamble e a Red Bull. Neste caso, é importante destacar que para conseguir compartilhamento nas estruturas logísticas algumas caraterísticas dos produtos devem ser entendidas, entre elas: a) Perfil de demanda (sazonalidade) b) Requerimentos similares para manuseio e armazenagem e c) Mesmos canais e ponto de venda dos produtos que vão ser incluídos na parceria.
Considerações Finais
Independentemente da área de atuação, 2015 e 2016 serão anos recordados pela grande quantidade de mudanças realizadas em Supply Chain; algumas delas resultado de uma ampla visão de negócio e, outras, como resposta necessária ante perdas de rentabilidade. Na medida em que as empresas tenham sido bem-sucedidas na execução das iniciativas, elas sairão da crise mais eficientes, produtivas e com maiores perspectivas de traduzir receita em EBITDA. Em 2017 os desafios não serão menores, mas parte dos resultados dependerão da continuidade destes trabalhos, que devem ser vistos como temas em revisão permanente e não como projetos pontuais.